Tuesday, April 10, 2007

O Segredo de Minha Irmã

Oitava Parte

Janaína me fitava com doçura nos olhos. Fazia-me carícias com a doçura de seus olhos.

“Boiól mandou trazer seu fumo, menino besta.” Tirou do bolso falso, costurado especialmente em seu vestido discreto, a bolsa do fumo de Boiól. “Güarda isso, menino.”

“A conversa é séria," dizia Janaína, brincando com os caracóis vivos de seus cabelos queimados. Nunca usara lenço nem cobertura, preferia queimá-los ao escaldante sol. A mãe dizia que aquilo era mal-costume, mas eu sempre tive o pensamento que era vaidade, muito pelo contrário. Vaidade era ter uma marca própria, algo que a fazia original, uma grife viva, colorida, corada, dourada... Fosse qual fosse seu segredo, não podia derrubar o meu, mas a leitora suspeitosa ou o leitor desentendido que decida.

Na noite da reunião com os gatunos das margens ao leito do córrego de Santa Maria, confessei minha ira aos mais poderosos personagens da cidade, e contei a todos de meu desejo de vingança. A conversa, que não posso reproduzir palavra por palavra, iniciou-se contudo da seguinte forma:

“João que me perdoe por tomar suas palavras, mano velho e amigo meu desde esses dias, mas que já tenho respeito como se juntos tivéssemos crescido. Olha que eu tenho algumas coisas a dizer sobre Jurandir, mas que são muito minhas, e que não ficaria bem compartilhar com ninguém que não Jesus, e mesmo assim só se Jesus pudesse responder ao dilema com suas próprias palavras – sinais não valeriam, pois seria trapaça, ou minto, meus velhos? Mesmo assim eu quero cá pedir um favor de vocês, que são os verdadeiros chefes, olheiros machos que existem por esse mato todo e as poucas pedras que fazem dessa cidade uma cidade. Quero que me ajudem a acabar com a raça desses bunda-moles que vêm infernizando as vidas do pessoal de bem dessa cidade!”

Uns olharam-se e os outros também, tanto nos poucos espelhos a decorar o barraco de Boiól, quanto aos outros. Vicentinho riu-se quando se deparou a primeira vista com Paulão, que havia quebrado a cara de muitos membros desse pessoal às quais vidas os fazendeiros e delegados e prefeitos e secretários e vice-prefeitos e bumba-meus-bois infernizavam. Gonzanlo era formado em matemática, e sabia que o dinheiro que subtraira dos bancos das grandes cidades subtrairía-se dos bolsos de muitos honestos trabalhadores; e mesmo que os vampiros oficiais ao longo do córrego de Santa Maria não pudessem sugar o sangue dos trabalhadores das grandes cidades, Gonzalo sabia e explicara a Vicentinho, que eles mesmos já haviam infernizado a vida de muita gente. Vicentinho, no entanto, não sentia peso na consciência porque ao menos não era tarado contido como Gonzalo. O mesmo se podia dizer de Agnaldo e Miguel, que individualmente ou unidos só causaram prejuízo aos muitos que pouco têm, e sentem o prejuízo em contundência inoportuna. O “mano velho e amigo meu” João dos Rosários e dos Sete Mortos, devia a sete famílias e dezenas de “manos velhos e amigos dos Sete Mortos” muito mais do que um pedido de desculpas. Ao invés de contentar-se em infernizar a vida dos cidadãos, mandou para o inferno sete marginais oficiais. Boiól contribuía ao sistema de péssima educação fornecendo maconha à meninada já desligada da tomada desde a placenta das mães que mal sabiam o que fazer com seus fetos, mas foram obrigadas a fazê-los gente mansa, até encontrarem outras drogas e criarem a futura geração marginal, mas esse conto ao futuro pertence, e bem distante dali.

3 comments:

Anonymous said...

Big Roy:
continuo acompanhando a saga atentamente, curioso para desvendar seus segredos.
Sinto um cheiro de Graciliano, uma pitada da prosa do velho Rosa. Segue em frente.
Uma curiosidade: já tens s história pronta e estás publicando aos poucos, ou ela vai nascendo por capítulos, às vésperas da publicação, como os velhos folhetins?
Um abraço.

Roy Frenkiel said...

Mano Jens, com perdao ao comentario de Pearl, que na verdade esta morto (Daniel Pearl foi o jornalista assassinado no Oriente Medio ha, se nao me enagno, 3 anos atras).

Entao eu confesso, amigo Jens, que nao vejo na minha literatura nada mais do que uma vontade de escrever que se concretiza lentamente. Agora, devo confessar uma coisa: Como eu escrevo, quando e por que, fica comigo, ok? Afinal, se eu disser como fa'co, ou meus leitores me mandam tomar banho na soda, ou acham que eu sou genio. Nem quero tomar banho na soda (doi) nem sou genio, assim que, para nao provocar escandalos ou causar que mocinhas desamparadas atirem suas calcinhas ao desketope, melhor nao contar o que se passa no Labirinto de Fausto de minha cabecinha de jerico ;-).

abraxao!

RF

Anonymous said...

Tá certo.
Um bruxo não revela os segredos de seus feitiços.