Monday, October 04, 2010

Rápidas sobre as eleições rápidas; Cada vez mais rápidas

Eis que a CNN reporta na tarde de Sábado que uma candidata ex “guerrilheira marxista” deverá assumir - pela primeira vez uma mulher - o cargo presidencial.

Há dois anos, quando presente na redação do Estado de Minas dos Diários Associados, vi a ficha criminal de Dilma Rousseff pendurada em uma das divisórias. Desde então, ainda antes da quase consumação de sua vitória agora postergada ao segundo turno já sabia o que a ficha representava para a história brasileira.

Sabia que alguns usariam a informação para enquadrá-la como criminosa. Pois bem, seria praticamente impossível que um assaltante fosse eleito presidente nos Estados Unidos. Já diriam certos macacos que um afro descendente ainda vai lá, mas um assaltante? Jamais.

Porém, o contexto da ditadura militar (aprovada e parcialmente financiada pela política externa estadunidense da geração) e meu próprio relacionamento direto com o Brasil automaticamente me dão o conhecimento necessário para não enquadrar os crimes de Dilma naquela época no contexto dos crimes cometidos atualmente em sociedades ultra populadas e de cotidianos violentos. O que ela fazia, aliás, não pode ser sana ou remotamente comparado a atos terroristas categorizados como tal em sociedades ou contra sociedades mais ou menos livres. Digo mais:

Conheci outros “criminosos” anti-militares da época e sei que ao menos um ou dois seriam capazes de governar o país tão bem ou melhor do que Lula.

Ou seja, o contexto da revolução democrática no Brasil, especificamente mirando a atuação dos soldados de rua, não dos eventuais líderes corruptos, é completamente brasileiro. Citar que uma “guerrilheira marxista”, ex ou não, poderá ser a primeira mulher presidente do Brasil é no mínimo uma meia-verdade, ou um ângulo extrema e vexaminosamente reducionista da imprensa. Por aí segue o etnocentrismo da mídia no país:

Seu maior problema talvez seja sua precipitação constante em julgar outros países de acordo com seus próprios valores, utlizando-se desse julgamento para atingir objetivos geralmente mercantis. Apesar de ser uma característica midiática clássica, a importância do etnocentrismo nos Estados Unidos é ampla por dois motivos principais:

1 – Como hegemonia atual o regime do país interfere mesmo que indiretamente nas ocupações políticas e econômicas de outros países em outras regiões do planeta. A política externa dos Estados Unidos, como costumeiro, já é voltada a seus próprios interesses e muitas vezes ignora a realidade doméstica das regiões com as quais trata amistosamente ou não. A mídia nos Estados Unidos infelizmente segue a mesma linha cultural de seu governo – mesmo podendo, por mídia, tornar-se uma boa contrapartida, o que ocorre em apenas poucos e bons canais – e ignora, na maioria das vezes, a realidade doméstica das regiões das quais reporta.

2 – O que a população local pensa em uma república democrática representativa como os Estados Unidos – o Brasil também, nesse caso – é bastante relevante quanto aos eventuais resultados eleitorais. Vale lembrar que em Novembro temos as eleições para senadores, representantes e governadores (entre outros politicos) no país, portanto o que a mídia reporta ajuda a moldar a mentalidade eleitoral, inevitavelmente. No caso da CNN, o mero fato de mencionar que uma mulher marxista assumirá o poder causa uma associação imediata na mente dos televidentes, seja ela positiva ou pejorativa. Lembremo-nos, pois, que como os personagens no mundo fictício de George Orwell em “1984”, as pessoas tem geralmente memória curta, e não se lembram que Lula foi o maior militante esquerdista (leia-se marxista) da história contemporânea brasileira e ainda assim seu melhor presidente centralista. O objetivo seria, pragmaticamente falando, a comunicação rápida e imediata de algo muito mais complexo com menor número de palavras possível. A CNN, que clama ter mais notícias por minuto (mesmo não sendo melhores notícias em qualquer periodo), preza sua economia temporal. No mais, acredito que seja a única forma de conversar com os desacostumados e desorientados telespectadores do país.

Culturalmente falando, no entanto, a mentalidade nos Estados Unidos é quase totalmente voltada às forças mercadológicas. Não importa quão à esquerda esteja parte da população, já sabemos que é uma esquerda completamente diferente da latino-americana. Como a mídia brasileira deixa parecer que Dilma é mesmo a criminosa da estirpe mencionada nas curtas da CNN, a CNN compra a imagem do ponto de vista mercadológico da mídia brasileira. O interesse da CNN nas eleições brasileiras, afinal, pode ser mais extenso do que parece. A companhia Time Warner, Inc., matriz da CNN, tem mais de um canal seu apresentado nos serviços a cabo em vastas regiões brasileiras. O resto, como diriam por aqui, é história.

Mais rápida: Ao contrário das eleições passadas à presidência dos Estados Unidos, a imagem do presidente que se retira contribuiu, no Brasil, imensamente à aprovação popular da provável próxima presidente. Enquanto a aprovação de George W. Bush atingiu o menor nível na história moderna, a aprovação de Lula não podia ser maior. No entanto, ao contrário de outros momentos na história brasileira, há melhoras concretas a ostentar em troco dessa aprovação. Espero que os eleitores brasileiros sejam sábios e, no mais, a “sorte” está lançada.

RF

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