Wednesday, December 01, 2010

Sobre Drogas e o Amor ao Rio

Caro Jens, (Resposta a sua resposta na Toca do Lobo)

Lendo sua carta à amiga carioca, e vendo a maioria das impressões deixadas pelos seus interlocutores, sinto a necessidade de ao menos responder, aqui, o que penso sobre o tema:

1 - A primeira coisa a concordar é que o buraco é, de fato, mais embaixo. Operações bem sucedidas a parte, precisamos, em principio, entender que o sucesso delas não pode ser medido a curto prazo. Mesmo que o exército e a polícia militar tenham cercado, tomado e instalado UPPs em todos os morros da cidade, qual é a garantia de que as UPPs funcionarão, por exemplo, depois dos jogos planejados para o Brasil em 2014 e 2016? A tomada dos morros serve para desmontar o que estava anteriormente estabelecido durante décadas, um antro perfeitamente seguro para a liderança do crime organizado carioca. No entanto, enquanto apenas os morros permanecerem seguros, uma série de outros problemas velhos e novos ressurgem. Primeiro, os quartéis generais dos “cartéis” brasileiros foram afetados, mas não outros centros e quartéis urbanos ou interiorinos. Segundo, criminosos refugiados das favelas alastram-se a cidades do interior, inclusive em outros estados, como Minas Gerais. O crime urbano, aquele que ocorre além das favelas, também queda inafetado. Terceiro, enquanto a estrutura viciosa que leva ao tráfico de drogas e, mais, à violência pelo controle do mercado negro continuar intacta ou simbolicamente abalada, nada impede que uma nova geração de criminosos mais sofisticados se forme.

Caso o intuito das autoridades é de engajar-se em um confronto direto com toda e qualquer espécie de crime em qualquer lugar onde esteja, há inúmeras reformas pendentes. À não ser que todo o confrontamento termine com a morte dos criminosos, onde os apreendidos ficam presos? Nos mesmos presídios super-populados historicamente? Além disso, “vamos acabar com o crime” é uma frase linda e completamente irreal. Ainda há acusados de estupro livres no Brasil porque as entidades responsáveis pela convocatória ao sentenciamento ou até mesmo aos mandatos de prisão frequentemente erram ou desconhecem o endereço do criminoso.

2 – Está claro para quem enxerga de fora que essa resolução governamental ocorre às vésperas dos grandes jogos, as Olimpíadas e a Copa do Mundo. Evolucionalmente falando faz sentido: Quanto mais olhos estrangeiros atingem a vista do país, mais o país quer se enfeitar para aparecer.

Porém, estamos carecas de saber que a situação não é nova, que as políticas passadas perpetuaram e agravaram a situação, que a população carioca (e em todos os demais estados que convivem com favelas) sempre fez vista grossa intimidada não diferente da vista grossa feita pelos alemães inocentes quando passavam frente aos guetos dos renegados dos nazistas, e que os fatores envolvidos na criação e sustento dessas favelas são complexos, geralmente ignorados e nenhuma atitude radical é tomada para sua resolução.

Está certo que a política brasileira dos últimos oito anos atendeu a necessidades reais do país e que o mesmo encontra-se a caminho de erradicar a miséria absoluta e em constante ritmo de inclusão social. Ainda assim, a exclusão ainda é extrema, a miséria absoluta ainda existe, o descaso governamental ainda é grande e, o pior, o debate é muito estreito.

A maioria das postagens “preocupadas” que li pelas redes sociais dita culpas: “São os ricos e a classe média que abastecem esses lugares!” Mito total e absoluto. Pobres também usam drogas, muitas drogas, e mesmo se todos fossem vítimas de uma crise econômica ímpar, a demanda continuaria e haveria fornecimento. “Os usuários fomentam o tráfico!” Claro, e assim sempre será, aliás, é o óbvio ululante. Mas pedir que usuários não existam é o equivalente a pedir que homossexuais deixem de existir para aqueles que ainda se incomodam. “Ah”, lá vem doutor encher o saco, “mas usuário não nasce usuário!” Verdade, verdade, mas torna-se usuário, usa, existe e sempre se tornará, sempre usará e sempre existirá. O uso de drogas faz parte da natureza humana e sempre fará, tanto medicinal quanto recreativamente. “A culpa é do governo!” E quem elege o governo em um país supostamente democrático? Onde estão os constituentes querendo um debate sério sobre o tema?

3 – Drogas são objetos inanimados. Ao contrário de armas, brancas ou de fogo, que só servem para ferir ou matar, drogas tem inúmeros propósitos, desde cosméticos a medicinais a psicológicos a recreativos. Não atacam ninguém, não pedem que ninguém as use e viciam talvez 90 vezes menos do que as pessoas, pesadamente desinformadas em um sistema comandado por pessoas que fazem de tudo para que o debate sério não seja levantado, acreditam.

Esse debate precisa ocorrer. Não só sobre favelas, ou sobre tráfico de drogas, mas sobre a natureza das drogas em si, a viabilidade de sua regularização, códigos penais diferentes do brasileiro (vide o holandês), a origem da proibição às drogas (pesadamente política, e não medicinal, como muitos ainda acreditam), as alternativas de romper com o código legislativo das Nações Unidas, além de temas sociais já discutidos, mas aparentemente ainda negligenciados, como os que você cita, Jens, em sua menção do texto do professor da UFRGS.

É muito simples, fácil e, na minha opinião inútil culpar uma classe (facilmente antagonizada pela classe “rival”) pelo consumo de drogas, e assim fazendo culpar usuários. Isso só perpetua a perseguição do próprio rabo: Usuários existem e sempre existirão. A guerra contra as drogas nos Estados Unidos não só não amenizou a situação, como um crescimento exponencial da violência e do consumo ocorreu desde que a guerra foi originalmente declarada. Se usuários sempre existem, o que mais importará é onde obterão o mesmo produto que obterão de todos os modos. O maior exemplo da ineficiência da proibição, além das próprias drogas, se não suficiente, é o da Proibição dos anos ’30 nos Estados Unidos, época que facilmente elevou o status quo do crime organizado estadunidense. Quantas novas proibições com os mesmos resultados serão ditadas antes de perceberem sua inutilidade?

Outro detalhe: Confirme, se possível, qual é a porcentagem de usuários de drogas que se viciam e se matam com as mesmas. Aposto que ficará surpreso. A grande maioria dos usuários não se matarão, como tanto gostariam tantos. Não se matarão, não se viciarão, e não causarão dano a absolutamente ninguém. Fumantes de maconha viverão mais tempo do que fumantes de cigarro, e causarão menos danos públicos caso continuem fumando em privado. Resumindo, não confiem em mim, pesquisem, informem-se pelas fontes certas, mas meu ponto é que a proibição das drogas gera muito mais problemas do que sua eventual regularização.

Digo mais, como opino a favor de uma rede social de confiança interna, onde todos cuidam de todos mesmo com a intenção final de cuidar apenas de si (ruas seguras aumentam minha liberdade individual), também penso que de nada adiantará antagonizar o grupo de viciados que sim se matam e danificam. De nada adianta criar mais um segmento excluído pela população. Quanto menos marginalizarmos, creio, menos marginais teremos.

Concluindo, acredito que as operações no Rio de Janeiro foram um desastre tanto estrategica quanto socialmente falando. Não acredito que a violência diminuirá a longo prazo por causa delas, mas acredito que a polícia e o exército podem desviar o crime do Rio de Janeiro em tempo suficiente de receber os olhos do mundo para as Olimpíadas e a Copa do Mundo, mesmo que tanques às ruas potencialmente criem novos “terroristas”, e que a repressão militar gere maior repressão social que, como qualquer outra, tende a explodir cedo ou tarde à face de quem reprime. Ainda assim, desejo boa sorte a todos, e se amor serve para alguma coisa, também amo o Rio de Janeiro.

RF

10 comments:

Jens said...

Oi Roy.
Vamos por partes.

1. Acho que todos concordamos que a forma mais eficaz de causar defecção nas tropas do exército das drogas é proporcionar aos moradores das favelas, através de serviços sociais, um mínimo de dignidade que nunca desfrutaram. E também oferecer aqueles jovens perspectivas concretas de uma existência digna sob o abrigo das normas que regem a sociedade. Ou seja, trabalho pleno e salário justo.

2. Não creio que seja um mito total e absoluto afirmar que “são os ricos e a classe média que abastecem esses lugares!” Concordo que não sejam os únicos, mas são os principais sustentáculos financeiros do lucrativo negócio, pela simples razão que têm mais dinheiro. A classe média quer a droga, mas abomina a violência que vem na esteira. Ou melhor, enquanto a violência se restringe ao morro, tudo bem. A chiadeira só se faz ouvir quando os bárbaros vêm para o asfalto, como aconteceu na recente convulsão no Rio de Janeiro. Não tiro a minha formosa e preciosa (na opinião de algumas belas damas) bundinha da janela. Se alguém atirar uma pedra, o meu telhado vai quebrar. O passado condena.

3."O uso de drogas faz parte da natureza humana e sempre fará, tanto medicinal quanto recreativamente". Perfeito. Mas isto não significa que o tráfico e o consumo não sejam comabtidos quando provocam efeitos extremamente deletérios no tecido social. Não tenho conhecimento dos números oficiais sobre os crimes gerados pelo tráfico e consumo de drogas, mas, empiricamente, posso avaliar que são devastadores. Todos os dias (eu disse todos) há um crime relacionado com as drogas. E estou falando apenas de Porto Alegre e da região metropolitana. O Estado não pode assistir esta chacina de braços cruzados.

4. Quanto à liberação das drogas, é preciso definir em primeiro lugar de que tipo de droga estamos falando. Sou favorável à descriminalização da maconha, mas não do cocaína e do crack. Se a primeira é uma droga leve, a segunda é barra pesada e a última pesa toneladas. Nesta tarde mesmo, falei com um conhecido, radialista, que estava apavorado. Gastou 200 paus da rádio em crack (ficou dois dias trancado em casa, fumando) e agora não tem como repôr a grana. Possivelmente vai perder o emprego. O crack é praga avaassaladora e vicia com uma rapidez impressionante, da mesma forma que destrói vidas. Impressiona também a constatação que, quando está de cara, o usuário sabe que está indo para o buraco, mas basta conseguir cinco paus e vai pra boca pegar uma pedra. Não dá pra tratar como um doentinho que não sabe o que faz. Em se tratando de crack, a grande maioria está matando e se matando. Sei que na Holanda, tempos atrás, foi criada uma "zona livre" para o consumo de drogas. Foi um desastre. O lugar se transformou numa pocilga habitada por farrapos humanos.

5. Acho muito simplismo creditar a investida sobre os morros cariocas apenas como uma ação com vistas aos eventos esportivos a serem realizados num futuro próximo. Convém lembrar que os traficantes estavam perdendo seu território para o Estados através das UPPs. Decidiram dar uma demonstração de força, queimando ônibus e carros, e se ferraram.

6. Este comentário já está muito extenso e nao pretendo esgotar o assunto. Não cheguei a lugar nenhum e não pretendo chegar. Apenas alinhei algumas considerações para reflexão e debate. Haveria ainda muita coisa para falar, como os crimes urbanos sem relação com as drogas e a corrupção policial, por exemplo. Mas já passa das sete da noite e eu tenho que tomar banho e me arrumar para ir ver a Preta Timm, que está de aniversário.

7. Antes de encerrar, uma notícia econômica. A guerra já tem um vencedor, as Organizações Globo. Um dia depois de serenados os ânimos, os vendedores da tv por assinatura invadiram o Complexo do Alemão. Em uma única tarde venderam 200 pacotes do Net Combo. Afinal, o show não pode parar.

8. Um abraço.

Roy Frenkiel said...

Jens:

1 - Okay, essa nao foi a parte dificil de engolir em meu texto entao.

2 - Mito, infelizmente. Mito, como papai noel e fadinhas e deuses. Todos usam drogas, quem tem e quem nao tem. Quem nao tem arruma, quem tem, tem de sobra. Sim, ricos tambem pagam mais impostos porque tem mais dinheiro, obviamente. Mas a demanda existe em todas as partes. Quanto a passados que condenem, eu nao te condenarei se voce for usuario e gostaria de saber que voce tambem nao condenaria. Faz parte.

3 - Nao discordo disso. Discordo radicalmente de que alguem tenha a remota esperanca infantil de que algum dia as pessoas deixarao de demandar a droga. Se isso e impossivel, por que entao bater na mesma tecla? Alem do que, o caminho geral e de descriminalizacao, nao o contrario. Voce quer responsabilizar o usuario de drogas pela violencia de terceiros, eu entendo, e mais simples assim colocar uma face ao problema, mas eu e voce sabemos que esse nao e o problema e nao e dai que a violencia nasce.

4 - Antes de definir quais drogas regularizar, seria interessante entender as drogas. Nao falo mais nada sobre esse assunto no momento. Primeiro vamos saber as drogas, o sistema de uso, vicio etc e depois conversamos sobre isso.

5 - Eu sou da seguinte opiniao: Se funcionar, concordo com a operacao. Nao acho que funcionara. Se eu estiver errado, serei o primeiro a comemorar. Mas sim, tenho poucas duvidas de que seja pelos jogos.

Abraxao

RF

Halem Souza said...

Roy, nos últimos dias havia decidido ficar apenas no meu alienado mundo da Literatura, mas essa discussão não me deixou ficar quieto. Há pelo menos um ponto de concordância entre nossos pontos de vista. Está neste trecho da sua postagem:

"Mas pedir que usuários não existam é o equivalente a pedir que homossexuais deixem de existir para aqueles que ainda se incomodam. “Ah”, lá vem doutor encher o saco, “mas usuário não nasce usuário!” Verdade, verdade, mas torna-se usuário, usa, existe e sempre se tornará, sempre usará e sempre existirá. O uso de drogas faz parte da natureza humana e sempre fará, tanto medicinal quanto recreativamente".

Antes de invectivar qualquer outro usuário de (outras) drogas, faço questão sempre de me lembrar que consumo muito álcool, em altíssimas quantidades. Um abraço

Marcelo F. Carvalho said...

Roy, meu problema com o sistema adotado pelo governo é:
1 - Tem fins eleitoreiros;
2 - Está acontecendo porque o Rio será palco de grandes realizações a partir do ano que vem (que já está na porta);
3 - Conhecendo a "sutileza" e o "preparo" da polícia carioca temo pelos moradores que ganham a vida com trabalho e honestidade.
4 - Queima de ônibus e carro são recorrentes na Baixada e grupos de extermínio são famosos desde os anos 80 (antes até). Agora é que "descobriram" o monstro?
____________________
Assim como você, torço de verdade para quebrar a cara, mas tenho, assim como o Halem, a péssima mania de ser pessimista.
____________________
Abraço forte!

Jens said...

Oi camarada Roy.
Algumas considerações:

1. Não se trata de condenar ou absolver. Isto é atribuição do Grande Manda-Chuva Lá de Cima ou do poder judiciário terreno.

2. Trata-se, isto sim, de assumir responsabilidade, saber que cada ação nossa gera uma reação que pode ser danosa não apenas para nós mesmos, mas também para a sociedade. Neste caso, a minha busca pelo prazer que a droga proporciona pode fomentar dor e morte.

3. Alguns vícios abandonei. Outros mantenho com parcimônia. Nem todos legais sob à ótica do ordenamento social.

4. Nunca roubei ou matei para satisfazer as minhas vontades. Há porém quem o faça, da mesma forma que existe quem recorra à violência para ter o privilégio de atender às minhas necessidades hedonistas e embolsar o meu rico dinheirinho.

5. Como já disse, basta um pedregulho para estilhaçar meu telhado de vidro. Não é uma situação agradável, não convivo com ela pacificamente, nem por isto ainda tomei a decisão radical de abolir da minha existência estas formas de satisfação pessoal. Como na canção, é preciso saber a dor (principalmente) e a delícia ser o que é. Não é uma tarefa para cavalheiros descuidados. Como observou o bardo inglês: "se todos recebêssemos o que merecemos, quem de nós escaparia do chicote?" Eu não, certamente.

6. No entanto, procuro agir no sentido de amenizar o impulso das chibatadas. Ainda não cheguei no nível da ingenuidade otimista do Dr. Pangloss de achar que tudo está certo no melhor dos mundos possíveis, mas como estou numa fase de renegar o niilismo, com vistas a obter um lugar no Purgatório, (o mais perto possível da fronteira com o Paraíso), prefiro acreditar que tudo vai melhorar. É uma posição tão confortável como achar que tudo vai dar errado.
7. Agora, vou almoçar.
Um abraço. A luta, o debate, continua.

8. PS: Já notou a semelhança dos jornalistas com as lavadeiras de antanho: como a gente gosta falar, PQP!

Um abraço.

Roy Frenkiel said...

Bom, entao la vamos em ordem e post especifico pra cad'um.

Halem,

Fico muito contente em que voce tenha encontrado justamente nesse ponto a nossa concordancia. A questao nao seria o que eu e voce fazemos, individualmente, mas sim o que existe, o que se pode esperar dos outros e o que nao se pode esperar dos outros.

Quanto ao consumo do alcool, ilegal em alguns quantos paises e ja proibido nos Estados Unidos, sendo o alcool importante ate em conceitos religiosos (o simbolismo do vinho, por exemplo), nem precisamos ir longe. Qual e a porcentagem de adolescentes e criancas que se matam usando drogas licitas, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos?

O uso de drogas ocorre independentemente do que eu e voce queiramos.

Abrax

RF

Roy Frenkiel said...

Marcelo,

1 + 2 + 3 + 4 + = a = penso.

Abrax

RF

Roy Frenkiel said...

Jens, amigao, eu entendo seu ponto, mas o que digo nao e que voce ou eu tenhamos que nos perdoar individualmente.

Vamos la:

Se voce quer dizer que as classes mais abastadas fornecem o trafico de drogas, se nao lucram com ele, voce isenta de culpa as classes menos abastadas que tambem fomentam o trafico ou lucram dele? Claro que nao, certo? Portanto, falar em classe aqui so cabe para exemplificar a muitos "certinhos" que pensam que dinheiro e sinonimo de boa conduta etica ainda em pleno seculo 21, que a coisa nao e bem assim. Perfeito. A proporcao do abastecimento financeiro do trafico vem de tantas classes... Caminhoneiros, tanto no Brasil quanto em Timbuktu, compoem uma dessas classes. Prostitutas tambem hehe.

Quitando o causo das classes, entao, o problema nao e o que eu e voce fazemos individualmente. Ontem discuti com um amigo daqui dos Estados Unidos a respeito e o camarada tirou a carta magica: "O dia que voce tiver filhos, se ainda pensar assim, conversamos." E a necessidade iludida do cidadao para com si ou para com o que mais ama de criar um mundo melhor. Nao digo que seus esforcos individuais sao vaos, mas exigir um comportamento global, generalizado, contrapondo um comportamento vigente que e global e generalizado nao me parece realista. Outra:

A logica ataria o usuario a violencia, mas isso tambem simplifica a realidade. Por que a violencia nos Estados Unidos e tao menor do que no Brasil? Pois, quanto mais profunda a crise tem se mostrado, o indice de violencia mais tem espichado. Claro que a policia (aqui, extremamente chata, ainda que imersa em alguns classicos problemas sociais dependendo da regiao) funciona melhor aqui do que ai. Mas nao sei ate que ponto comecar por ela ajuda. A violencia e tao mais complexa do que "uso = fomentacao de trafico = violencia". Ha trafico organizado nao violento, por incrivel pareca. Ha as vezes menos violencia no trafico de drogas de algumas regioes do que na venda de bebidas em botecos. Contextualizar tudo seria a pedida.

Haha falar faz bem. To carente paca, Jenzinho.

Entao "pra cima com a viga" ;-)

Jens said...

Roy, de um modo geral, violência não é bom para os negócios, especialmente do tráfico, pois espanta a seleta clientela.
Eu acho que o que fazemos individualmente importa sim, e muito, no contexto do tráfico de drogas. A este respeito, fui buscar munição pesada. Ai vai o bazucaço:

Em entrevista ao jornal argentino Página/12, o governador eleito do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, fala sobre a política de segurança pública que vem sendo construída pelo governo federal. Como ministro da Justiça, Tarso foi um dos principais elaboradores dessa política que está ganhando atenção internacional a partir dos recentes acontecimentos do Rio de Janeiro. “É uma concepção de policía comunitária, que deve ocupar os espaços e articular seu trabalho com programas sociais nas zonas em conflito”. Na entrevista, Tarso também fala sobre o problema do narcotráfico e do consumo de drogas no Brasil:
“O narcotráfico gera uma estrutura de integração perversa entre pobres, ricos e traficantes, Eu não falo só dos viciados, mas também daqueles que usam a droga como parte de sua sociabilidade. Os ricos e integrantes da classe média devem compreender que o consumo, ainda que seja por prazer ou por modo de vida, é o que alimenta a violência. Por isso, esse ciclo de combate ao tráfico e à instrumentalização da juventude das favelas tem que passar também por esses setores. Eu falo do Brasil, um país muito grande e com elementos específicos. No Brasil é necessária a repressão penal aos que compram inclusive pequenas quantidades, pois também são responsáveis pela construção do sistema de poder dos grupos mafiosos. O adulto que compra uma pequena quantidade de droga de um menino de 17 anos é um criminoso, porque está na ponta de uma cadeia de circulação e produção de delitos que gerou esta situação no Rio”.

Um abraço.
Não tá morto quem peleia.

Roy Frenkiel said...

Jens,

Nesse sentido discordamos, e aqui e a realidade que precisa falar, e nao nossas opinioes ou as de Tarso. Novamente, batendo na mesma tecla:

O que eu faco e o que voce faz nao fazem a menor diferenca se ainda ha milhares de outros que fazem diferente. A consciencia essa que voce conclui nao convence outras pessoas, que racionalmente podem optar, e estarem certos por optar, pelo consumo de uma droga.

Poderia argumentar a Tarso com municao nao so mais pesada, mas mais embasada, mais detalhada e mais completa (complexa), que a proibicao do consumo de drogas e o modo que ha decadas procuram amenizar esse consumo cria uma cultura de integracao perversa entre pobres, ricos etc. O alcool gerava essa mesma cultura quando foi proibido nos EUA. O cigarro geraria a mesma cultura se fosse proibido.

Nao so isso: A estereotipacao, o preconceito inerente que se tem dos pobres, somados a vilificacao politica dos usuarios, recriam essa cultura de integracao perversa entre membros que poderiam se desenvolver em uma sociedade.

A falta de infra-estrutura basica, a falta de capacidade de reformacao dos ja marginalizados, a educacao escassa e a falta de oportunidade profissional gera essa integracao perversa, e nao, jamais, o consumo de drogas. Seu trafico ilicito e o unico a ser responsabilizado nesse caso.

Ainda assim, repito: Eu tambem acredito piamente que individuos possam "mudar" partes do mundo com conduta diferente. Mas volto ao obvio ululante: Consumidores de drogas sempre existirao, nao importa o que voce escolher ser, se consumidor ou nao.

Enfim, Jens, o discurso de Tarso e tao velho e falido experimentado... Por que insistir no mesmo angulo?

Quanto ao que diz sobre as UPPs... Nao acredito que seja nem por onde a coisa deva comecar, nem por onde deva terminar, muito menos como foi feita. Se funcionar, no entanto, serei a favor, claro.

abraxao

RF