Agora sim, a década se completa. Perdoem aqueles que acompanham este autor meio confuso com os números se no ano passado já a declarava feita. Nunca entendi esse negócio da década ou século terminar um ano depois de seu zero. 2010, de 2000, contamos dez anos ou não? Aí explicam: “Não existiu o ano zero.” Ah, tá, entendi, mas esperneio, baixinho, teimoso taurino que sou: “Mas de Janeiro de 2000 a Dezembro de 2010 são dez anos”, e tal, tudo em vão. Década é década, né? Fazer o que, não posso só contar os meus dez anos, tenho de aderir à convenção humana temporal.
Escrever a retrospectiva de uma década, porém, já foi desastroso ano passado. Foi aquela coisa de lembrar os clichés e recontá-los a todos os que já conhecem e se cansam de clichés. Este ano quero fazer diferente. Quero falar de alguns aprendizados de minha vida enquanto envelheci dos vinte aos trinta anos de idade. Quero traçar um paralelo cronológico de 2010 apenas com os flashbacks necessários. Mas o que mais importa é o presente, e assim aprendi em 2010.
Foi um ano complexo e completo. Teve, não como a maioria, início, meio e fim. Ao contrário do retorno de Saturno tão famoso nos ciclos dos entendidos nas invenções da astrologia, meu “retorno” durou aproximadamente três anos. Aos 29, justamente, as certezas que um dia tive já haviam se desfeito e não era mais confusão o que sentia, e sim não-saber. E não é que esse não-saber não se desajustou, apenas se recauchutou? No começo era aflição não saber. Não saber exatamente o que serei baseando-me naquilo que via, não saber o que o dia de amanhã traria, não saber se meu coração ancorava-se no correto correspondente, não saber se seria o que queria ser, se era o que queria ser, se podia chegar a fazer o que tinha de fazer para sê-lo, e, sinceramente, ainda não sei a maioria dessas respostas. A diferença é que hoje, já ao fim dessa trajetória anual, menos me importa saber e mais me importa fazer. Espero que isso se traduza, em 2011, em maior conhecimento não só de causa, mas de consequência.
*Logo em Janeiro faleceu uma grande figura para a história contemporânea. Howard Zinn, historiador e ativista social desde os tiros dos anos setenta, escrevera entre roteiros teatrais e outros muitos e bons livros a famosa “Uma História dos Estados Unidos”, que reconta os caminhos dos antepassados oprimidos, e não opressores, dos governados, e não governantes, e dos trabalhadores, e não empregadores da grande hegemonia. Zinn contribuiu à história da humanidade uma sincera retrospectiva do ponto de vista do constante Outro da civilização humana, focando no gigante da civilização Ocidental. Zinn foi essencial em minha vida de pré-estudante universitário, quando descobri pela primeira vez que muito do que tinha aprendido no passado ressoava misticamente estúpido.*
Foi um ano de reviravoltas pessoais. Quando li em um blogue “pelaí” (parafraseando meu amigo Pirata) dizendo da faxina interna da autora me irritei, mas hoje entendo o contexto. Foi mesmo assim, faxina interna, revirar e desmontar e desarmar e remontar e rearmar sem quebrar uma só peça da louça. Comecei inteiro pela metade, e terminei pela metade inteiro. Irônico isso, claro, mas faz parte, e só entendi que faz parte depois de passado o passado. São as forças da natureza fazendo-se sempre presentes dentro e fora de nós.
*Do Brasil aprendemos que a fúria da natureza não perdoa classes econômicas. Pelas tórridas chuvas de Dezembro, o desabamento da pousada luxuosa da Sankay de Ilha Grande, Angra dos Reis, deixou quinze vítimas confirmadas. Miami, cidade que geralmente convida turistas das regiões mais frias, os chamados “snowbirds” (pássaros de neve, alusão à migração aviária do hemisfério sul), teve o clima mais frio desde antes de meu nascimento. Experimentamos tanto frio que não estávamos preparados, e este Dezembro não segue diferente. Também conhecemos a importância da infra-estrutura, e porque tê-la ainda representa melhor proteção até mesmo contra a fúria da natureza. Porto-Príncipe, capital do Haiti, jamais será a mesma depois do terremoto de 7 graus de magnitude que a destruiu no dia 7 de Janeiro. Um terremoto de escala similar também tremeu no Chile em Fevereiro, e o contraste da infra-estrutura comprovou-se verdadeiro. Apesar da mesma magnitude, os pontos mais atingidos do país não demonstram nem remotamente o mesmo nível de destruição. No Tibete, novamente, o terremoto que atingiu a região em Abril também demonstrou-se trágico em maiores proporções. O vulcão islandês Eyjafjallajökull (nem me peçam para falar esse nome, foi “copy-paste” mesmo) entrou em erupção em Abril escurecendo os céus europeus. Os donos do mundo, nós, seres voadores, tivemos o vôo restrito pela fúria da própria terra.*
(Segue na próxima postagem)
Friday, December 17, 2010
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