Monday, November 23, 2009

Ideologias e o Século 21

A qual time torces? Percebam que não falo no esporte, este pouco importa. Futebol, basketball, baseball, rugby, volleyball, natação, handball, hockey, hockey em gramado, polo, polo aquático, velejo ou nado sincronizado... Pouco importa o nome do esporte. Qual é seu time?

Qual mão lhe é melhor prezada? A esquerda ou a direita? Tens pensamentos conservadores, tradicionalistas, ou modernistas, progressistas? Pensas que o mundo deve ser menos livre socialmente, ou mais liberal? Gostas da teoria da evolução ou da invenção do criacionismo? Gostas dos Hebreus ou dos Palestinos? Brasileiros ou Argentinos?

De acordo ao construtivismo de Alexander Wendt, o mundo é o que fazemos dele. Há o deconstrutivista nato, Paul Sartre, que vai além: O mundo sequer existe sem nossas construções específicas, e certamente não existe um coletivo que não parta da percepção individual. Pois, o mundo é vasto, gigantesco, flutuante, inconstante e ininterrupto. Seus inícios foram recontados e interpretados aos milhões. Seus fins são previstos e interpretados aos bilhões. Para ambos construtivistas e deconstrutivistas, contudo, o mundo não é antes de nós, e qualquer seja sua essência, o que realmente importa é o que fazemos dela. Portanto, para ambos, a ideologia importa.

Segundo analistas como Gregory Weeks, o Brasil se destaca da/na América Latina por dois motivos: Portugal colonizadora (e não a Espanha com sua suma ultra-ortodoxa cristã e a violência intensa de sua colonização, o que causou revoluções violentas e massivas em cada um dos países hoje independentes na região), quiçá um pouco menos ideológica, um pouco mais pragmática. A filosofia vigente na região sempre foi, e ainda é, extremamente pragmática. Desde Getúlio Vargas e Medici ao General Luiz Inácio “Lula” da Silva, o Brasil foi mais pragmático, mais objetivo, mais interessado em seus próprios interesses do que a Cuba Castroista, Venezuela Chavista, Colômbia Uribista, e os de sempre, Paraguai, Uruguai, Haiti (e sua colonização ainda mais violenta da parte dos franceses seculares), Peru, Bolívia, Equador, e os demais países das Américas hispano-francesas. Salvo quiçá a Argentina, mas essas são traquinagens para outros textos.

No Brasil não houve um Fidel Castro. O nacionalismo militar não foi mais baseado na ideologia fascista, e sim no militarismo, uma característica não só da América Latina, mas uma consequência direta da guerra da Tripla-Aliança entre Brasil-Argentina-Uruguai e o devastado Paraguai. Logo, apesar da geopolítica praticamente inalienável no contexto latino-americano, o Brasil chegou a caminhos diferentes e é, atualmente e sempre, o país mais forte da América do Sul. Curiosamente, contudo, não é o mais estável dos países. Enquanto o Brasil encontrou seus conflitos de esquerdas e direitas, motivou suas bases intelectuais a adesão ao comunismo, estimula e estimulou a presença de ideologias e ideologistas frenéticos em seu seio patriarcal, há apenas um país em dois hemisférios, centro-sul, que realmente manteve a linha do pragmatismo intacta.

Costa-Rica pareceu não se importar com os movimentos abestalhados de seus vizinhos todos. Sendo o único verdadeiro exemplo anti-realista (no contexto de relações internacionais), o estado decidiu abdicar de sua soberania e pedir a proteção exclusiva das forças armadas estadunidenses. Deu certo. Seu produto interno bruto é usado quase que exclusivamente no desenvolvimento de suas infra-estruturas. Apesar de haver corrupção, como em todas as partes do planeta incluindo cemitérios, logra gastar domesticamente em proporções mais elevadas do que os Estados Unidos, que gasta ao menos um terço de seu orçamento com o exército. Abdicar da soberania, como sabemos, não é algo fácil. É a antítese dos conselhos d’O Príncipe machiavélico. É o avesso do avesso das normas mundanas desde que Napoleão convenceu seus súditos do nacionalismo francês, e desde que Voltaire avisou que a pátria amada força o ser humano a odiar todas as outras.

Pois, segundo Marvin Astrada, mestre em relações internacionais e assistente do governo estadunidense em sua agência investigativa federal, o problema central é a ideologia. A ideologia que, como qualquer religião, indica certezas onde qualquer pessoa sã apenas enxerga dúvidas. A ideologia que cega os sábios, que implica a fraqueza dos que bravejam, que incita a violência em pacifistas, que separa bases, que dificulta argumentos e esconde verdades, mesmo que sejam estas as mais gritantes, e ao mesmo tempo cria liberdades (Mandela, King), cria novas pátrias (Guevara, Castro), inventa novos conceitos de liberdade (Woodrow Wilson, Immanuel Khant) e constrói universos paralelos (John Lennon, Abie Hoffman). A ideologia que separa os estadunidenses entre republicanos e democratas, mesmo que sejam todos, em definições mais rústicas, da mais pura direita. A mesma, esta, a doce canalha, que faz com que minha pátria seja, necessariamente, melhor do que a sua por ser minha, e que pesa vidas iguais em medidas diferentes: Posso eu ser melhor do que você por ser israelense, ou você melhor do que eu por ser brasileiro/a?

O campeonato brasileiro de 2009 simboliza isso um pouco. Há corinthianos e há palmeirenses, gremistas e colorados, dos galos e das raposas, tricolores e rubro-negros, mas o que falta é o bom futebol. O futebol simples: Gols não só importam – Só gols importam. Desde quando o gringo Jordan pensava que defender sua cesta fosse mais importante do que sobrevoar a quadra atá a cesta do adversário? Não são partidas de futebol as que se jogam na banheira, e sim uma convenção de imbecís correndo atrás de uma bola para obtê-la e livrar-se dela o mais rápido possível. E corinthianos matam palmeirenses igual a londrinos quando matam liverpoolianos, não pensem não. O futebol? O pragmatismo básico, o óbvio ululante, atacar e fazer gols, por aí agoniza em pontos técnicos.

Sei que há ideologias necessárias. Dessas que fingimos acreditar para dar sentido às nossas vidas individuais. Sei que, em grande parte, definir o mundo à nossa frente pode ser mais frustrante do que inventar uma fórmula mágica para obter sempre o mesmo, e correto, resultado. E, em vidas que não se definem por si, a ideologia é a alma do pequeno e fútil golem.

No entanto, vejam o que acontece quando o pragmático Lula de Honduras abraçou velhas ideologias e concordou com as asneiras incabíveis de Ahmadinejad. O mesmo pragmatismo que visa manter o Brasil pacífico e emular as atuais decadentes hegemonias, tornando-se fogo de palha e entortando olhares europeus e norte-americanos. Dois passos para frente e um para trás. Ideologia... Será que quero uma dessas para viver?

RF

5 comments:

Jens said...

Oi Roy.
Sou colorado, gaúcho e socialista. Ideologia? Sim, eu preciso de uma para viver, para melhor estar no mundo. Mas eu sou um animal em extinção, velando o caixão de uma velha morta - dona Ideologia. A moda hoje é ser niilista, mas esta roupa não me serve.
Cabe lembrar, claro, que não acreditar em nada é tão confortável como acreditar em tudo.
No mais, dá-lhe Inter!
Pra cima com a viga!
(Pô e a Costa Rica, quem diria? Ao que parece manter relações carnais com os EUA, como queria o argentino Menem, não é tão doloroso assim, hehehe...).

Um abraço.

Jens said...

A propósito da visita do presidente do Irã, uma análise surpreendente ponderada da dona Eliane Cantanhêde, na FSP, que pode ser acusada de tudo (inclusive foi alcunhada da "vaca nazista" pela ala psicopata da esquerda. Sim, também há), menos de lulista.

ELIANE CANTANHÊDE

Antes perto do que inacessível

BRASÍLIA - Mahmoud Ahmadinejad vem aumentando sua presença na América do Sul, que fica logo abaixo e sofre influência direta do arqui-inimigo do Irã, os EUA. Não deve ser por acaso.
Primeiro, Ahmadinejad passou a visitar a Venezuela com uma frequência curiosa. Depois, aproximou-se do Equador e da Bolívia. Agora, botou literalmente os pés no Brasil, trazendo mais de 200 empresários de vários ramos, de agricultura a energia.
Diplomacia se faz muito pelos interesses bilaterais, um pouco pelos regionais e às vezes pelos multilaterais. Na vinda de Ahmadinejad, esses três ingredientes estiveram fortemente presentes, enquanto gays, feministas, bahá'ís e judeus gritavam do lado de fora dos palácios. Para o mundo ouvir. A visita é mais um marco da polêmica política externa brasileira, que já criou "frisson" com uma cúpula Mercosul-países árabes em Brasília e atraiu ao país num só mês os presidentes de Israel, da Autoridade Palestina e agora do Irã.
A intenção não é assumir um lado da questão, nem apoiar o regime iraniano, muito menos compactuar com as barbaridades de Ahmadinejad, que nega o Holocausto e já pregou "varrer Israel do mapa".
É, ao contrário, fazer como o Brasil faz inclusive com a Venezuela de Chávez: perto o suficiente para ter penetração e diálogo, longe o necessário para não se comprometer com regimes, governos ou decisões pontuais. Ao contrário, tendo força moral para criticá-los. É melhor ter o Irã por perto e submetido a alguns compromissos do que tê-lo isolado para fazer o que bem entender. Aliás, o simples fato de haver uma crescente oposição interna é bom sinal. Ahmadinejad sabe que ela não está sozinha e que o mundo está de olho. Não deixa de ser uma forma de proteção.
Engana-se quem acha que é uma ação do Brasil veladamente contra os EUA. Ao contrário, trata-se de um jogo bem combinado.

Roy Frenkiel said...

Grande Jens!

Sobre ideologias, realmente nao tenho a resposta. Sou corinthiano roxo, ;-), mas nunca consegui aderir ao socialismo, ou a qualquer especie de conservadorismo (acho, alias, vivo com a certeza ideologica, de certo modo, que qualquer especie de conservadorismo eh extremamente estupido) ou qualquer ideologia politica. Ja fui religioso, mas quando consegui perceber que o mundo nao correspondia as expectativas fantasticas da religiao, deixou de fazer sentido.

Nao tenho a resposta, claro, como o proprio texto que eh tosco e bruto parece demonstrar. Chego a acreditar que ha algumas ideologias necessarias, mas nao sei se estas sao as mais "justas" ou simplesmente as mais intensas na naturza de minha propria psique. Acredito, contudo, e sempre acreditei, que o certo deve ser feito, e o errado necessariamente evitado. Logo, nao consigo enxergar um mundo regido por ideologias que sempre pense nisso, em fazer o certo, e nao exatamente o que prega a ideologia. Assim eh o socialismo, por exemplo, que, bem como o puro capitalismo, jamais existiu.

Quanto a Ahmadinejad, nao mencionei os detalhes do assunto nem tudo que foi discutido por aqui. O Brasil tem maior oposicao interna do que os EUA perceberam a presenca de Ahmadinejad. Mas antes de mais nada, perceba que nunca acusei nem acusarei agora a jornalista ou qualquer outra pessoa de lulista ou anti-lulista. Isso eh problema interno brasileiro, e realmente pouco me importa nesse sentido, logo nao se preocupe. O que me importa eh o que Lula diz, o que faz, e sua compreencao verdadeira do que ocorre a sua volta. Quando Lula diz que apoia o desenvolvimento de energia nuclear para fins pacificos, ele nao pode deixar de saber (sera que nao enxerga?) que enquanto Ira for o pais que eh, extremista, exclusivista, machista ao extremo, e ainda militar e totalitario, que especie de programa nuclear sera desenvolvido apenas para fins pacificos? E, para aqueles que pensam que Ira e Libano e outros paises do Oriente Medio deveriam ter bomba atomica para contra-balancear os EUA (o que levaria, quase certamente, a uma terceira guerra mundial e nao a uma estabilidade de super-potencias nucleares), pensem que Ira e seu presidente tem ideias destrutivas em seu discurso diplomatico oficial.

Sera que a jornalista diria o mesmo caso Hitler visitasse Lula em plena segunda guerra mundial? Ou caso quem viesse ao Palacio fosse Idi Dada Amin? Sera que Lula esta disposta a conversar assim com Omar Kadafi ou estaria disposto a dialogar livremente com Sadam Hussein?

Jens said...

Roy, só uma observação: a tolerância com ditadores homicidas não vem de hoje e não está restrita ao Brasil do presidente Lula. Basta ver a política internacional dos EUA através dos anos. Neste jogo, não existem mocinhos, o que há são interesses, sejam eles monetários ou estratégicos.
Outra coisa, você diz que o certo deve ser feito, e o errado necessariamente evitado. O que é certo e o que é errado? Na definição destes conceitos, começa a ideologia. Você tentar fugir, mas a bruxa acaba te pegando, hehehe.

Um abraço

Roy Frenkiel said...

Respondendo segundo a logica do proprio texto, convincente nao deve ser porque eu mesmo ainda repenso:

1 - Brasil nao eh EUA. A ideologia acaba fazendo as pessoas acharem que eh. Nao eh EUA nem pro mundo, nem pra America Latina. Nao tem a mesma influencia. Nao tem a capacidade de se proteger sozinha. Mal alimenta sua propria populacao internamente. O pior erro do Brasil eh se jogar do arranha-ceu quando acaba de aprender a planar.

2 - O pragmatismo (de certo modo o realismo eh pragmatico, mas tambem usa de ideologias, de outros modos, tanto que negam a mera possibilidade de que um pais como Costa-Rica exista) visa que o custo deve ser menor do que o beneficio. A ideologia prega que mesmo quando o custo excede o beneficio, se a questao eh ideologicamente assumida, a decisao sera tomada contra o proprio beneficio. Nao importa se, objetivamente, custara mais do que se ganhara. Se a democracia fizer parte da ideologia, existira a justificativa convincente de que o Iraque precisava ser democratizado pelo senhor Bush.

abrax

RF