Wednesday, July 25, 2007

O Segredo de Minha Irmã

Ah, como havia coisas que eu ainda não sabia... Quantas eram!


Vigésima-Terceira Parte


“Agora, é verdade, eu posso voltar pra casa, porque se Úrsula morrer matada, pois, que se dane, não é a minha mãe!” Gritei, interrompendo Janaína.

“Úrsula morrer matada?” A interrupção lhe causou um engasgo. Se ela me surrava com a verdade, libertaria-me da aflição de meu martírio de uma vez por todas. Ou esse era meu ímpeto, que, parcimoniosamente, se esgotou antes de que fosse tarde demais. “Do que você fala, moleque?”

“Essa é a segunda vez que alguém me chama de moleque nesse tom petulante. Janaína...” Passei de sério a rogador, “Me deixa em paz! O que você veio fazer aqui depois de tanto tempo? Todo esse tempo sem vir, sem me visitar. Agora chega contando merda? Eu não podia morrer sem saber que sou adotado?”

“Podia...” Ela respondeu, chorosa, agora ela era quem não podia mais conter as lágrimas vulgares. “Mas nunca sem que você soubesse quem é o seu pai, Caçá. Por isso, só por isso eu vim.”

Nunca entendi essa sua ausência. Pensei, logo pronunciei em voz alta. “Nunca entendi essa sua ausência...” Fiz de conta não ter ouvido suas últimas palavras. “Por acaso Jurandir não disse que estou proibído de pisar na casa de dona Úrsula?”

“Ignorante!” Janaína não costumava se exaltar. Não levantara a voz tantas das muitas vezes que brigamos, paciente, à espera apenas do último bote para ousar qualquer excesso nervoso. Raramente se excedia. Naquele crucial momento de nossas vidas, não suportou minha regressão. Reinava em mim, novamente, a total incerteza, a massa cinzenta, a náusea de sentir amor concomitante ao ódio. Janaína, apesar de já bastante acostumada, não mais tolerou minha infatilidade embutida ao choque emocional. “Você agora a chama pelo nome, como o blasfemo chama por Deus despeitosamente pronunciando as letras proibidas?” Berrou, tornando-se vermelha por baixo de sua dourada pele.

Mas, meu sangue de coragens e covardias mescladas lançou-se fervido à polpa de minhas veias, e contestei com o mesmo fogo, sem implorar por nada mais, transtornado: “A ignorância e a blasfêmia melhor me servem, irmã. Você é cega e me cegou consigo! Se sou ignorante, se não pude enxergar que o seio de minha pátria era plastificado, sou como qualquer imbecíl que não diferencia entre a mentirosa castidade e a santidade da luxúria de Maria. Culpa tua! Tua e de dona Úrsula, sim, que é esse seu nome. Foi Jurandir quem lhe mandou nunca antes me visitar? E o que mudou? Foi ele que censurou as suas cartas, esquálidas, mirradas, decadentes, de poucas palavras e estoicismo, saudosismo, selando com algumas dicas corriqueiras a se viver melhor? E o que mudou? Você, que deve ser íntima do porco Jurandir, foi avisada dos meus motivos, dos motivos do meu desaparecimento? Confesse tudo, então!”

“A isso vim,” retornou-se a face à ternura habitual, “a isso vim, Caçá... Sou mais íntima de Jurandir do que você imagina... Entenda...”

“Enteder o quê?” Levantei-me de uma só vez afastando seu corpo e suas mãos estendidas da proximidade de minhas coxas. “Você? Íntima de Jurandir?”

1 comment:

Jens said...

Hehehe... É agora!