Friday, July 13, 2007

O Segredo de Minha Irmã

“Agora você some da minha vista, então.” Mandou o Porco.

Não precisou dizer duas vezes.

(Fim do primeiro livro.)

Vigésima-Primeira Parte


A dor enaltece meu pecado. Enobrece o mártir, bem o diga Jesus, pudesse dizê-lo. O maior dos meus pecados foi revolucionar sem saber o que queria com a revolução, procurar em máximos os mínimos necessários pela população. Enfim, atrair pessoas a um movimento conjunto, a uma nova massa, não mais alienígena, mas cidadã mesmo que marginal. O problema nasce no descontrole. Gonzalo que foi o comandante, capitão, e eu peguei apenas o bonde errado.

Certo, os petiscus doidus fizeram sua parte, e invasões soturnas carregaram maior importância. No entando, continuamos derrotados pelo descontrole. Pela idéia: construir novos hospitais. Quem os construirá? Pela demanda: construir novas escolas. Quem as levantará? Ao invés disso, já víamos crescendo muralhas, algemas, doenças... Não... O descontrole era necessário. Ninguém sabia o que ocorreria. Ninguém era dono do destino. Minha dor - por sinal - desde que comecei, lentamente, a desaparecer da casa de dona Úrsula e da companhia calorosa de Janaína, enaltecia o pecado de soltar a praga às ruas, criar um exército de indivíduos descontrolados.

Ademais, não era responsável solitário, nem único. Todos os participantes eram adultos. Todos os indivíduos que queimaram o cercado amadeirado do senhor Prefeito sabiam bem o que faziam. Às ordens já desordenadas do bilíngüe Gonzalo, destruíram a propriedade do autoritário, que apenas logrou a fuga emparvoecida acompanhado dos próximos. Desmoronaram pedras, quebraram cada tijolo, cada vidraça, cada batente, o mármore, os vasos, rasgados os tecidos das cortinas, fogo ao inflamável, e em poucas horas as margens de Santa Maria alargáram-se ao infinito em um clarão voraz.

Naquela mesma noite, procurou-me Jurandir. Não me encontrou. Gonzalo relatou que o povo se dispersou em vapores. Poucos queriam saber o que viria. Nenhum tinha medo. Disse que, conforme mandado, relatava após a debandada. Contou também que Jurandir me procurava, mas eu estava bem escondido. Ali ninguém me encontraria. Perguntei pela saúde de minha família, e Gonzalo respondeu que estavam todos muito bem. Não soube até hoje se era blefe a do assassino de João, mirando contra a saúde da mãe Úrsula e de Janaína. Soube apenas que estavam bem, muito bem, e isso me bastava. Pedi a Gonzalo que as vigiasse por mim. Quis saber dos outros companheiros, mas não abri mais a boca a questionar. Finalmente, pedi a Gonzalo que nunca mais me procurasse. Prometeu. Nos despedimos, e nunca mais nos vimos. Soube que sumiu da cidade, espantado com’um corvo por capangas de Francisco Aleixo, o ex-prefeito. Aleixo viu-se impedido oficialmente de seu cargo depois da destruição de sua propriedade. A cidade pediu em único côro que renunciasse, e renunciou por medo, cagaço puro. Tudo parecia resolvido. Em uma das muitas madrugadas de minhas fugas da casa da mãe Úrsula, sobre a vigília de Janaína, perpetuei a desgraça que me afastou, de uma vez por todas, de sua cercania..

2 comments:

Jens said...

Ressaca pós-revolucionária? Hehehe... Caça está aprendendo que não se atiça impunemente os instintos bestiais das massas (no caso, a horda). É hora de pagar a conta.
Abração. A estória está rolando legal.

Anonymous said...

Consegui abrir nada no post anterior, ROY. Nem a página de comentários... Bj.