Wednesday, June 20, 2007

O Segredo de Minha Irmã

Eu... Paralisado, a espera de um milagre. Paralisado como via-me com Janaína, quando veio me visitar.

Décima-Sexta Parte

O Quinto Plano Desmoronado


O abalo juntou-se à comoção n’um baile caquético. Ninguém soube ou até hoje sabe quem transmitiu a notícia da morte de João a Gonzalo. Ninguém compreende até hoje com qual fúria. Sei apenas do que sentia frente à víbora obesa, roliça. À face colorada carregava uma mágoa engimática. Escondia, atrás de seus olhos, uma sede maior de vingança do que qualquer inconveniência a mim causada ao testemunhá-lo violentando minha mãe. E era por ela que eu mais temia. Meus pensamentos não pesavam pela morte de João. Não prezava tanto minha própria vida, que ganhava significado a cada passo dado. A cada entranha contraída pela pena da decência, das boas escolhas, mesmo às márgens de um córrego esquecido que, como eu, transfórma-se fatalmente em um outro rio, e transborda pelos esgotos das grandes cidades. Porque naquele momento, eu era apenas uma idéia. Um pensamento de marginalidade. Uma junção de gestos dados e entregues por idéias antepassadas, fermentadas à base de leituras feiticeiras, entregues por um misterioso ninguém, que desapareceu tão logo apareceu em minha vida. Mas, o que ainda me beliscava, me recordava a humanidade, era o medo que sentia pela morte de minha mãe, pela hipótese de que o sem-nome a caminhar com uma Colt .45 a punho direito, fosse buscá-la e à Janaína, e decapitá-las como fez com João dos Rosários.

“Claro que você não sabe o que fez.” Disse o porco Jurandir, ao que eu não respondi, obviamente, petrificado em meu posto. Ele prosseguiu:
“Claro que você nunca soube o que fazia. Uma arruaça. Uma bagunça. Um desnorteio, e nada mais. Cercado de incompetentes. Esse era o seu plano? Essa foi a sua elaboraçãozinha? Se eu quero comer a sua mãe, menino, eu como. Se eu quero bulir com meus empregados, eu bulo. Se eu quiser foder com a tua vida, eu fodo, porque sim, menino. Sim, moleque. Eu tenho mais do que você. Nem fui eu quem inventou as regras desse jogo, nem fui eu quem quis jogar pela primeira vez. Tá pensando que eu nasci assim?”

“Gordo?” Reflexo meu. Não sei o que me prontificou. Senti que a grossura da tensão alisáva-se suntuosamente. Era sórdido o momento, quão foi a minha resposta.

“Gordo...” Suas veias pulsávam como larvas encurraladas entre seus nervos e sua pele. Rastejávam como vermes por toda a extensão de sua gordurosa face. “Você ainda tem a coragem de brincar com o diabo na terra do próprio. De pôr chifres no demônio que não custava desfilar à paisana pelas margens da Puta Maria. Menino... Olhe para o chão, pra sepultura do teu amigo, e me diz se tu estás em vantagem nessa conversa.”

“Não vejo ninguém melhor armado do que eu aqui, Jurandir.” Senti a coragem requentando meu pulso. “À não ser que haja um exército esperando ali fora.” Jurandir impôs-se em minha direção, mostrando a pistola que cingia a tiracolo com o mesmo sorriso torpe pintado-lhe os lábios.

“Não, rapaz. Aqui não tem exército, eu me basto. Bastei-me até hoje. Mas eu não quero a tua morte. Não agora, pelo menos. Você me é útil. Muito útil. E será se quiser ver sua mãe e sua irmã bem.”

2 comments:

Jens said...

"Suas veias pulsavam como larvas encurraladas entre seus nervos e sua pele. Rastejavam como vermes por toda a extensão de sua gordurosa face." Beleza de construção literária.
***
Mais uma reviravolta na trama? Tô curioso.
***
Abraço.

Anonymous said...

...é agora?

bjs

Ophélia