Friday, June 18, 2010

Digo adeus porque posso

Saravá, Gigante Saramago. Alguns me perguntam por que sinto a necessidade de contestar ou discutir ou até mesmo brigar com opiniões alheias (apesar de meu respeito eterno pela liberdade de expressão e de achar que toda e qualquer opinião é necessária a um debate íntegro sobre qualquer produto da condição humana contraditória) sempre que as encontro. Em nome do grande escritor de nosso idioma, o único nobelista, respondo hoje, aqui e de uma vez por todas:

1 – Porque quando há injustiça, discórdia ou agressão à realidade, a única coisa que me resta é a palavra, especialmente a escrita.

2 – Porque escritores e pensadores como Saramago assim me permitem. Faço porque posso, e ponto final. Espero algum dia fazer melhor.

Abrax,

RF

5 comments:

Jens said...

Contestar opiniões alheias é extramemente salutar, camarada Roy. Como disse mestre Millôr: "a discussão pode não trazer a luz, mas acaba com muita ideia idiota". Assim, crescemos todos.
Quanto a Saramago, uma única observação. Valeu, camarada.
Ah, e também pedido: que transmita um abraço pro Karl e pro Vladimir Ulianov, Lá do Outro Lado.

Roy Frenkiel said...

Agradeço como você, Jens, de coração, e peço que transmita os mesmos abraços.

Na verdade publiquei esse texticulo em homenagem ao gigante, já que das milhões de opiniões favoráveis me deparei com uma que dizia que o mestre "não fará falta a ninguém" por ser comunista e ateu. Poderia deixar quieto, mas você sabe, a mente coça quando a burrice extrapola as fronteiras do ouvido e, como contestei, deixei meu cartão postal não à maioria, mas à possibilidade da minoria passar e perceber que foi Saramago, entre poucos outros, os que nos abriram as portas para discutir e debater e brigar com o que discordamos. Como um pai de liberdade de expressão, o gigante deveria ser agradecido por essas pessoas que mal esperam o corpo esfriar para cospir em seu túmulo. Graças a ele isso ainda é possível, pois todos sabemos o quão possível isso seria em um regime dogmático baseado nas crenças primitivas na Igreja Católica.

Forte abráx,

RF

Jens said...

Oi Roy. Li a opinião a que te referes, num comentário lá na Luma. É o uivo das trevas.
Hoje recebi através de email um texto do Saramago escrito quando fez 86 anos. Como também és operário da palavra, acho que vais achar interessante.
Abraço.
***
86 anos
José Saramago

Dizem-me que as entrevistas valeram a pena. Eu, como de costume, duvido, talvez porque já esteja cansado de me ouvir. O que para outros ainda lhes poderá parecer novidade, tornou-se para mim, com o decorrer do tempo, em caldo requentado. Ou pior, amarga-me a boca a certeza de que umas quantas coisas sensatas que tenha dito durante a vida não terão, no fim de contas, nenhuma importância. E porque haveriam de tê-la? Que significado terá o zumbido das abelhas no interior da colmeia? Serve-lhes para se comunicarem umas com as outras? Ou é um simples efeito da natureza, a mera consequência de estar vivo, sem prévia consciência nem intenção, como uma macieira dá maçãs sem ter que preocupar-se se alguém virá ou não comê-las? E nós? Falamos pela mesma razão que transpiramos? Apenas porque sim? O suor evapora-se, lava-se, desaparece, mais tarde ou mais cedo chegará às nuvens. E as palavras? Aonde vão? Quantas permanecem? Por quanto tempo? E, finalmente, para quê? São perguntas ociosas, bem o sei, próprias de quem cumpre 86 anos. Ou talvez não tão ociosas assim se penso que meu avô Jerónimo, nas suas últimas horas, se foi despedir das árvores que havia plantado, abraçando-as e chorando porque sabia que não voltaria a vê-las. A lição é boa. Abraço-me pois às palavras que escrevi, desejo-lhes longa vida e recomeço a escrita no ponto em que tinha parado. Não há outra resposta.

Marcelo F. Carvalho said...

Quando morre um Enorme, o que fazemos com este livro?
Saramago poderia ficar apenas na feitura das palavras (mágicas, diga-se), mas resolveu ser mais, muito mais. Deu a cara, os cornos e, claro, as palavras para que outros refletissem ou, como é de costume num mundo cego, atacassem.
Faz falta pra burro um homem como ele.
Perda lamentável.
______________
Abraço forte!

Luma Rosa said...

Nos deixou grande obra e quem dá esses pitacos 'estranhos' é porque não refletiram seus escritos.

E pensar que somente pela necessidade, o escritor publicou. E se não fosse ela? Não tomaríamos conhecimento deste monstro.

Espero que existam muitos monstros por aí, assombrando esse povo esquisito!

Boa semana! Beijus,