Thursday, September 11, 2008

Ira - Onze de Setembro

Há sete anos, em uma bela tarde de 11 de Setembro, empacava minhas malas paulatinamente à espera da carona que me levaria ao aeroporto de Tel-Aviv, para que de lá pudesse fazer a conexão via Nova York a Miami.

Enquanto desdobrava uma cueca aqui e uma camisa social acolá, o telefone tocou. Era minha irmã mais velha, que vivia na mesma cidade, próxima ao meu apartamento. Sem grandes excitações em seu timbre, começou dizendo:

“Roy, hoje você não vai a lugar nenhum. Ligue a televisão.” E eu, é claro, liguei sem titubear. O que vi me deixou pasmo e chocado para o resto da vida. O segundo avião se estraçalhava na Torre, e demorou alguns minutos para que entendesse o que ocorria. Quando entendi, pensei, naquele instante e nos dias seguintes, que o mundo iria acabar, nem mais, nem menos.

Depois de quatro dias, no Sábado à noite, recebi uma chamada do aeroporto Ben Gurion dizendo que eu tinha lugar reservado para um dos primeiros vôos liberados depois do grande atentado. Às pressas, passadas onze da noite, juntei meus apetrechos e saí de férias. Desembarquei em um JFK (aeroporto de Nova York) caótico, de filas quilométricas e pessoas trazendo em face olhares vazios, de total incompreensão. Apesar de ter demorado mais do que o habitual para encaminhar minhas malas à segurança, demorou relativamente pouco, e logo me vi em Miami, abraçado por mamãe e recebido pela família.

No 11 de Setembro, quando vi as Torres caírem, liguei para uma ex namorada e pedi sua companhia. Vivia sozinho, e meus irmãos, apesar de também compartilharem o medo, não me serviam de fortaleza sentimental. Naquela noite, a mocinha me fez companhia a-sensual, e com olhos de uma israelense acostumada com bombas e explosões em praças públicas, não me consolou. Não entendia meu medo, não entendia a necessidade que eu sentia de solidariedade, como se o desastre tivesse acontecido comigo.

O mundo não acabou. Os Estados Unidos entraram, para todos os efeitos, na era Bush com o pé esquerdo. Além da falta de reação imediata do presidente George W. Bush, as resoluções dadas depois do atentado até hoje custam a dignidade do legislativo, judiciário e executivo da nação. O que conhecemos aqui por “Carl Rove Politics” tornou-se a realidade contundente e dolorosa de todos nós. Truques sujos, mentiras descaradas, contratações de juízes em base política, legislações absurdas para a “proteção” do povo estadunidense, como o Ato Patriota, os grampos telefônicos, a deliberação que, fatalmente, culminou na guerra do Iraque, e a economia a desmoronar pelos dispêndios irresponsáveis de uma administração que antes se julgava conservadora fiscal.

Não pior, mas certamente um fator da equação do 11 de Setembro são as conspirações variadas, especialmente da esquerda mundial, de que a CIA, os judeus, ou seja lá mais quem seja, derrubaram as Torres Gêmeas para justificar a guerra no Iraque. Armados de detalhes históricos e conjunções lógicas maleáveis, muitos grandes pensadores tentaram de tudo para provar que não foram terroristas islâmicos, mas ocidentais, os verdadeiros responsáveis.

Por um instante, até comprei alguma ou outra conspiração. A pior delas, infelizmente, veio de uma figura querida cujo nome prefiro deixar no ar, em que clamava que nenhum judeu havia morrido nesses ataques, nem nos aviões derrubados, nem nas Torres, nem nas ruas de Nova York. O ataque foi feito com a intenção de livrar judeus de sua fúria, já que foi feito por agentes da CIA, simpatizantes do sionismo.

Ao ler isto, automaticamente senti vergonha de algum dia ter acreditado na estapafúrdia da conspiração. Afinal, Nova York é a cidade do mundo que mais abriga judeus, mais do que todo a nação sionista, e dizer que nenhum judeu foi morto, ou poucos, calculadamente, é muito, mas muito mais ilógico, surreal e paranóico do que a iminência do terrorismo islâmico no mundo. Seja como for, me parece tão ou mais difícil acreditar que os Estados Unidos se auto-atacou do que alguns muçulmanos com faquinhas e canivetes sequestraram três aeronaves. Aliás, por que tão? Muito mais absurdo.

Sete anos depois, vivemos em um mundo perverso. Não tenho outro modo de relatar o que sinto pelo espaço geográfico chamado Terra e por seus inócuos habitantes. Perverso, malévolo e estragado. Podre, por dentro e por fora.

Depois do 11 de Setembro, as pessoas nos Estados Unidos mostraram mais solidariedade do que antes. Conto-lhes um segredo que a maioria de vocês já deve saber: O estadunidense mediano é frio, distante, apático à realidade alheia, despreocupado com o que ocorre com seus próprios vizinhos, e, além disso, jamais empresta o ombro a ouvir desabafos, salvo as raras excessões da intimidade. Nesses tempos seguidos do atentado, as pessoas mudaram, por alguns dias, a conduta corriqueira.

Sete anos depois, e tudo voltou ao normal. Depois de um governo falido de um partido que prioriza a educação criacionista a providenciar ao povo seguro de saúde universal, que prioriza a construção de presídios e corta o financiamento das escolas públicas, que prioriza a garantia do porte de armas, mas não quer nem saber de reforma energética, que em um piscar de olhos salva as grandes agiotas Fannie Mae e Freddie Mac, mas promete à população 600 dólares de retorno tributário como medida emergencial, e deixa de entregar o dinheiro a mais de um terço da população (eu incluído), é o mesmo partido que vence, segundo o Gallup, nas pesquisas, com um candidato que não só votou com Bush 90% das ocasiões, mas tornou-se mais bushista desde que a corrida presidencial começou, adotando os cortes tributários de sua administração como plano central em sua agenda, mudando sua posição em relação a escavações petrolíferas nas costas marítimas dos Estados Unidos, e movimentando-se à extrema direita com sua vice-presidente Sarah Palin, além de ser um homem bélico, que não se importaria em ficar no Iraque por 100 anos desde que houvesse “vitória”, termo vago e usado para encobrir nobremente a sujeira de nossos porcos.

Há sete anos, ouvi da comunidade mundial, massivamente, que os Estados Unidos era a sede do império do mal, e que todos deveriam votar pelo presidente da dita nação, para que um Bush jamais estivesse no poder. Hoje, leio de cada vez mais brasileiros que votariam em John McCain para presidente, especialmente da direita, que piamente crê que a direita daqui é a mesma dali (severo erro histórico, segundo Eric Hobsbawm). Ou seja, há brasileiros, cada vez mais, que pessoalmente querem me fazer mal. A eles, só me resta dizer “obrigado”. Logo, logo, estarei aí, no Brasil que me recebeu a pedradas desde a infância, que cospiu em mim, que me humilhou, que me fez ver tudo que há de pior nessa terra em um show cotidiano, para, pelo menos, não fazer parte de uma nação assassina e obtusa.

Aos demais, perdão pelo desabafo pueril. Hoje o dia dói mais do que ontem.

Roy Frenkiel

5 comments:

Anonymous said...

Eu acho que o 11 de setembro foi uma amargo lembrete de que o mundo continua instável e embrutecido, apesar da falsa idéia de um futuro melhor embutida no fim(?) da "Guerra Fria".

Também não comprei a idéia de que os próprios norte-americanos promoveram o atentado, o que não significa que concorde com o modo como conduziram o revide.

Entendo seu desabafo; algumas coisas são mais difíceis de calar dentro da gente do que outras.

Um abraço.

Luma Rosa said...

Roy, seria injustiça eu dizer que esse foi o seu melhor texto no blogue, mas foi sim, o mais emocionante! :-)
Naquele dia eu tinha acabado de acordar e pensei ser um filme na tv. Acredito que muita gente ainda não acredita que o fato aconteceu, assim como tem gente que não acredita que o homem já pisou na lua.
De uma forma ou de outra, o mundo mudou depois daquele dia. Foi um dia que muitas pessoas fizeram suas análises pessoais do que vale ou não a pena nesta vida. Não acredito que o mundo esteja de todo podre. Beijus

Anonymous said...

O Brasil mandou dizer que estava errado a seu respeito, amor. Mandou até pedir desculpas aí, pelas coisas do passado. O Brasil disse pra mim que passou um tempo meio perdido, lá pelos anos 70,80, mas que agora tá legal, meio que se encontrou... rs. É verdade que, agora, o Brasil já sabe que você "tá comigo", né? Mas nem é por isso que vai te tratar bem... ou nem só por isso. rssss
Que teu desabafo te traga mais leve! Tô esperando...
Beijo!

Anonymous said...

11 de setembro, será eternamente uma data histórica. onde mts pessoas buscaram via telefone notícias. alegres ou tristes.
verdadeiras ou falsas. muita falação, a ferida foi aberta. e a cicatriz traz a dor até hoje.
11 de setembro eternamente uma data.

bj

Cris said...

Oi, Royzito ,

Obrigada pelo torcida . Meu amigo se recupera ( em parte ). Nesse 11 de setembro eu trabalhava quando um cliente idiota entrou no escritório contando a notícia e rindo muito. Talvez de nervoso, agora eu penso. Mesmo assim um idiota.

Beijão.